Famoso por fotos do Rio, fotógrafo
viajou pelo país para trabalhos científicos
‘Píncaro do Itatiaia, 1875.
Ponto culminante do Império do Brazil; 2.712 metros sobre o nível do mar’, diz
a legenda da fotografia.
O registro, pendurado em uma
das paredes do IMS Paulista, é uma das imagens feitas pelo fotógrafo carioca
Marc Ferrez no âmbito da Comissão Geológica criada naquele ano por dom Pedro
2º.
A conquista dos domínios do imperador acompanhada do registro da ciência,
dentro do melhor espírito do século 19, é uma parte do que recupera a exposição
‘Marc Ferrez: Território e Imagem’
Entrada da Baia de Guanabara, Niteroi-RJ, ~1890 |
Mas, sobretudo, a exposição
em cartaz a partir desta terça (26) mostra a interação entre o trabalho de
Ferrez com os avanços da ciência, enquanto tema, e com a tecnologia da imagem,
à qual esteve sempre atento e cujo progresso no Brasil ajudou a impelir.
A trajetória de Ferrez, diz
Sergio Burgi, coordenador da área de fotografia do IMS e curador da mostra, se
confunde com a história da imagem.
Ferrez nasceu no Rio em 1843,
‘quatro anos após a descoberta da daguerreotipia’, processo fotográfico
pioneiro, lembra o curador.
No lapso de seus quase 80
anos de vida —morreu em 1923—, viajou o país ao lado de cientistas, modificou
câmeras para o registro de grandes panoramas,
e fez experimentos em autocromia, técnica para produzir imagens
coloridas que durou todo o primeiro terço do século 20, criada pelos irmãos
Lumière.
Foi também um dos
responsáveis pela introdução da invenção mais famosa dos Lumière no Brasil: com
seus filhos, a partir de 1907, participou da nascente atividade cinematográfica
no país.
A exposição segue um viés
cronológico, mas como linha tênue para compreender a relação da vida do artista
com as inovações que traria a virada do Império para a República.
Os registros dos primeiros
seis anos da atividade do fotógrafo se perderam em grande medida no incêndio de
seu estúdio, em 1873.
Uma parte do que se salvou
ocupa uma parede e uma vitrina da primeira sala; Burgi destaca o fato de que
todas as tiragens da mostra são originais, preservando a forma de apresentação
escolhida por Ferrez para as imagens.
O trabalho de Ferrez aparece
ao lado de fotos de contemporâneos seus, como Militão Augusto de Azevedo.
Jardim no Passeio Público, Rio de Janeiro, ~1900 |
Aparecem aqui também os
registros idílicos da paisagem do Rio. ‘É o mais conhecido, mas você percebe
que isso se dá depois do processo de trabalho de uma câmera que percorre o
território’, diz Burgi.
No ano seguinte à destruição
de seu estúdio, Ferrez conseguiu se reequipar, indo para isso à França, com a
ajuda de um empréstimo de um amigo, Claudio Chaigneau.
Próximo de engenheiros,
Chaigneau pode ter tido um papel na indicação de Ferrez para a Comissão
Geológica do Império, chefiada pelo canadense-americano Charles Frederick
Hartt.
Aparecem não só registros de
formações por todo o país, como o já citado pico do Itatiaia, como também da
proximidade de Ferrez com cientistas; o próprio Hartt aparece em retrato tirado
do álbum de família do fotógrafo.
Nesta sala, anota-se a ação
de outro incêndio, o do Museu Nacional, que em setembro de 2018 destruiu boa
parte do material coletado pela comissão, guardado nos acervos de Dom Pedro II na instituição.
Os materiais expostos vieram
não só da coleção Gilberto Ferrez —historiador da fotografia neto de Marc—, que
integra o acervo do IMS, mas também de instituições americanas como o Smithsonian.
Um dos destaques são as
imagens feitas por Ferrez em diapositivo, que eram exibidas em sessões públicas
por cientistas nos Estados Unidos, para onde foram levadas por outro membro da
comissão, o biólogo Richard Rathbun.
Pertencentes ao Smithsonian, serão projetadas na mostra, bem como imagens
pertencentes à Fundação Getty, que tem um dos álbuns remanescentes da Comissão
Geológica —uma versão digital pode ser vista pelos visitantes.
Ferrez trabalharia ainda para
a Marinha e as ferrovias.
Partida para colheita café, Vale Paraíba, 1885 |
Surgem, nessa etapa,
registros impressionantes de fazendas de café. São um aspecto menos difundido
da carreira de Ferrez e trazem um importante dado histórico.
Enquanto na década de 1880 a
indústria cafeeira queria se vender para o mundo mostrando aspectos de
modernidade, como a mecanização, resplandece o fato inequívoco de que a mão de
obra era, ainda, escrava.
Ferrez se tornaria, ainda,
documentarista das mudanças do Rio de Janeiro modernizado no começo do século
20.
As obras de infraestrutura
urbana implementadas pelo prefeito Francisco Pereira Passos aparecem em seu ‘Álbum
da Avenida Central’.
Nesta sala estão, ainda,
imagens em grande formato, obtidas graças à insistência do fotógrafo em
aprimorar equipamentos, como câmeras de varredura, que permitiam panoramas
extensos.
Essa inquietude tecnológica
se desdobra no interesse pelo cinema e na fotografia colorida —com ela, Ferrez
registraria viagens e a família.
'Uma suíça, Marecottes', foto feita na Suíça, em 1915 |
Embora a mostra se ancore na linha da vida do fotógrafo, para compreender em detalhe sua trajetória está sendo lançado, em paralelo à mostra, o livro ‘Marc Ferrez: Uma Cronologia da Vida e da Obra’.
Pradilla Ceron,
responsável pelo Núcleo de Pesquisa em Fotografia do IMS, cobre na obra lacunas
sobre a trajetória de Ferrez e traz, com isso, também amplo material para a
compreensão do desenvolvimento da fotografia no Brasil.
MARC FERREZ: TERRITÓRIO E IMAGEM
Quando Visita guiada com Sergio Burgi nesta ter. (26),
às 18h. De ter. a dom. e feriados, das 10h às 20h; qui. até as 22h. Até 21/7
Onde IMS Paulista (av. Paulista, 2.424)
Preço Grátis
MARC FERREZ: UMA CRONOLOGIA DA VIDA E DA OBRA
Preço R$ 49,50 (160 págs.)
Autor Ileana Pradilla Ceron
Editora IMS
Texto: Francesca Angiolillo |
FSP
(JA, Mar19)
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