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domingo, 20 de dezembro de 2020

Na indústria criativa, artesãos estão entre os mais prejudicados pela pandemia

Com baixa inclusão digital e longe de centros de consumo, comunidades ficam sem renda

 

Mestra ceramista Maria José Gomes da Silva, Turmalina-MG 


A pandemia arrebentou o negócio de Maria Aparecida das Graças Oliveira. Tecelã de Turmalina-MG, no Vale do Jequitinhonha, ela viu as vendas secarem após o cancelamento das feiras nacionais de artesanato, principal meio de escoar sua produção.

Na associação local de artesãs que ajudou a fundar há 28 anos, viu muitas colegas na mesma situação. ‘A gente não parou de trabalhar, só parou de vender’, diz. ‘Está todo mundo desmotivado. A gente viajava o mundo levando produtos; hoje, a gente está parada e não sabe até quando’.

A loja mantida pelas associadas ficou fechada durante quatro meses, por não ter como pagar as despesas fixas. Hoje, está aberta por meio período, mas os itens de cama mesa e banho que elas produzem quase não são vendidos. Com a perspectiva de suspensão do auxílio emergencial do governo -para muitas tecelãs, a única renda fixa nos últimos nove meses-,  2021 promete ser ainda mais duro.

‘A tendência é que as vendas piorem, com a segunda onda. A situação das famílias vai complicar. A gente não tem planejamento para resolver isso, não’.

Para muitos outros artesãos, a insegurança financeira foi regra em 2020. Levantamento do Itaú Cultural feito a partir de dados da Pnad Contínua, do IBGE, mostra o artesanato como o segundo setor da economia criativa mais afetado pela pandemia, tanto em números absolutos como proporcionalmente.

No primeiro e segundo semestres, atividades artesanais perderam 49,6% de seus postos de trabalho (atrás do mercado editorial, que perdeu 76,8%), o que corresponde a 132,8 mil empregos (atrás da moda, com 259 mil).

 

Giuliana e Gilvana Silva, artesãs da comunidade Vila Brasil, de Santarém-PA 


Sônia Carvalho, presidente da ONG Artesol, aponta uma conjunção de fatores para explicar esse impacto.

Para além da suspensão das feiras, o varejo, que antes comprava até 20% da produção dos artesãos, cortou gastos e deixou de buscar esses produtos. Houve artesãos que ficaram sem matéria-prima, já que muitas fábricas pararam e, quando voltaram, privilegiaram o fornecimento a clientes maiores. Por fim, todo o país perdeu poder de compra.

‘Nesse momento, ninguém está procurando comprar uma cesta ou toalha de mesa. Ninguém está preocupado em comprar nada supérfluo’.

Pesaram ainda a localização dessas comunidades tradicionais de artesãos (a maior parte está nas áreas rurais das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, enquanto o mercado consumidor se concentra no Sudeste e nas grandes capitais) e sua baixa inclusão digital.

Carvalho estima que, por esses dois motivos, os artesãos mais prejudicados tenham sido os indígenas. Na região Norte, que tem a maior população indígena do país, o artesanato corresponde a 38,6% da receita bruta da indústria criativa, a proporção mais alta no Brasil.

‘O ano foi péssimo em termos de mercado, mas pelo menos os artesãos puderam sobreviver com o auxílio que o governo deu’, diz. Uma pesquisa conduzida pela Artesol mostrou que entre 40 e 50% dos artesãos tradicionais receberam o benefício.

Nas contas de Carmem Pereira, outra tecelã de Turmalina-MG, a proporção de artesãs que pediram o auxílio na sua comunidade foi de 80%. ‘O governo não pode deixar o barco à deriva. Até que as coisas voltem à normalidade, há uma necessidade de os governantes continuarem pegando pela mão. Sozinho a gente não dá conta’, diz.

Além do auxílio, Carmen conseguiu captar recursos pela Lei Aldir Blanc, e se beneficiou de políticas públicas locais, como o projeto Arte Salva, do governo mineiro, que distribuiu cestas básicas para artesãos.

Nos últimos meses, projetos sociais da Universidade Federal de Minas Gerais e do CAV (Centro de Agricultura Alternativa Vicente Nica) também têm ajudado as comunidades.

A Lei Aldir Blanc foi acionada por muitas artesãs, mas contemplou uma minoria. Isso porque ela exige a Carteira do Artesão, documento emitido pelo governo que, num setor marcado pela informalidade, pouca gente tem.

Na ausência de apoio garantido do Estado, restam as saídas individuais. Carmen, que já revendia cosméticos para complementar a renda, fez desse seu ganho principal. Como são produtos de primeira ordem, desodorantes e sabonetes, não pararam de vender.

Já as artesãs que trabalham com barro na região tiveram a sorte, em março, de fechar parceria com a empresa Camicado para produzir uma linha de moringas, vasos e outros objetos domésticos. ‘Foi uma salvação, porque a maioria dos maridos das artesãs ficaram parados’, diz a artesã Terezinha Santos.

Com a crise, ela também passou a vender mais pela internet, mas reclama que, além das taxas cobradas pelos sites de vendas, o envio dos produtos por correio é caro e inseguro. ‘Para transportar as peças, a gente acaba pagando mais. Às vezes a gente manda, quebra, aí precisa repor. Complicou um pouco’.

O coordenador-geral de Artesanato e Empreendedorismo do Ministério da Economia, Fábio Silva, admite que ‘foi um ano diferente para todos". Responsável pelo PAP (Programa do Artesanato Brasileiro), que realiza as quatro maiores feiras do país, ele defende a continuidade dos eventos presenciais.

‘Uma peça de artesanato tem uma história, uma cultura, o artesão tem um porquê daquela produção’, afirma. ‘A história passada para o comprador, na feira, gera valorização muito maior do que para quem compra pela internet’.

 

Em 2020, apenas uma dessas feiras foi realizada, na primeira semana de dezembro. Feita em Belo Horizonte, teve tamanho reduzido (apenas dez estados) e, segundo Silva, foi ‘tranquila, segura e com nível considerável de venda’. (Segundo Cida Oliveira, ninguém da sua comunidade teve coragem de ir)

A pretensão, segundo Silva, é ampliar a parceria do órgão com o Sebrae para investir na capacitação digital dos artesãos, fazer um catálogo de produtos no site do governo e criar uma loja do programa no Mercado Livre. Ele ainda planeja lançar um aplicativo com orientações sobre exportação para os artesãos.

Para o artesão José Luís Ferreira, de Santos-SP, a priorização das vendas online na pauta do governo pode ser boa notícia —ele pensou em fazer uma loja digital para vender suas caixas de madeira, mas desistiu por ter ‘limitações com informática’. Ele, afirma, no entanto, que o artesanato já vinha passando por depreciação mesmo antes do vírus. ‘Ninguém dá muito valor, entendeu? E o material ficou muito caro, então não tem retorno’.


 

 

 


Fonte: Laura Castanho   |  FSP


 

(JA, Dez20)


domingo, 18 de março de 2018

Mercado de obras de arte se recupera e vai a R$ 208 bilhões


 Relatório aponta que colecionadores voltaram às compras
‘Salvador Mundi’, de Leonardo da Vinci


O mercado de arte movimentou US$ 63,7 bilhões, cerca de R$ 208,3 bilhões, no mundo todo no ano passado, registrando um primeiro aumento depois de dois anos seguidos de queda nas vendas.

Relatório recém-publicado pela Art Basel, o maior grupo de feiras de arte do mundo com eventos em Basileia, na Suíça, em Miami e em Hong Kong, compilou os números de leilões e vendas de 6.500 galerias de todo o planeta para constatar o que o alvoroço em torno das feiras deste mês em Nova York já deixava claro - a arte voltou a bombar.

Desde o colapso financeiro de 2008, esse mercado vem se esforçando para sair de uma recessão prolongada, com bilionários fugindo de leilões e galerias em tempos de incerteza na economia.
Mas, no ano passado, recordes seguidos em vendas públicas, entre eles a de uma pintura de Da Vinci por R$ 1,5 bilhão na Christie's, em Nova York, a obra mais cara em toda a história, já davam sinais dessa mudança de atitude dos colecionadores (veja os maiores negócios ao lado).

Essa transação específica, aliás, está por trás do aumento de 64% das vendas de obras de mestres antigos, um segmento do mercado que faturou US$ 977 milhões no ano passado, batendo um recorde anterior de 11 anos atrás.
Sem o Da Vinci, as vendas teriam, na verdade, encolhido no mercado de obras históricas, mas o interesse por trabalhos mais caros também está em alta, o que mostra que os colecionadores estão dispostos a gastar, mas evitam correr o risco de apostar em nomes novos.

Enquanto o mercado para obras de menos de US$ 1 milhão encolhe, trabalhos acima desse valor têm mais compradores. Vendas de peças acima de US$ 10 milhões mais que dobraram.
O grosso desse mercado, porém, continuam sendo as obras de arte contemporânea, um segmento que faturou US$ 6,2 bilhões sozinho.

Estados Unidos, China e Reino Unido, nessa ordem, continuam no topo do mercado de arte no planeta, com o maior número de vendas, enquanto galerias de países que sofreram recessão recente, entre eles o Brasil, adotaram outras estratégias.
Galerias brasileiras aumentaram presença em feiras estrangeiras, compensando o faturamento menor em casa com transações em dólares e euros no momento em que o real está desvalorizado.

O relatório da Art Basel aponta que o Brasil é o país mais bem representado em feiras de arte na América do Sul e que registrou alta de 40%, o que sinaliza maior interesse do público.
Quase metade das vendas das galerias analisadas, aliás, ocorre em feiras de arte, que vêm se multiplicando pelo mundo e responderam por US$ 15,5 bilhões, quase um quarto do total vendido ao longo do ano passado.


Texto: Silas Marti   |   FSP




(JA, Mar18)