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sábado, 23 de fevereiro de 2019

Escultor Richard Serra leva lâminas de aço gigantes a museu da Paulista



Pátio do Instituto Moreira Salles recebe peças de 19 metros de altura que pesam 140 toneladas

O escultor Richard Serra não gosta de monumentos. Nem do ‘brutalismo extremo, quadrado, sem nuances’, de São Paulo. Mas sua primeira obra na cidade parece negar todo esse discurso.

Na contramão da ideia de leveza e transparência da torre envidraçada do Instituto Moreira Salles, as duas lâminas de aço que ele fincou no pátio do centro cultural numa das pontas da Paulista são lápides secas, duras, impenetráveis.


Escultura 'Echo' de Richard Serra  


E, ao menos nas dimensões, monumentais —elas têm quase 20 metros de altura e juntas pesam mais de 140 toneladas. Tanto que tiveram de esperar dois anos para serem montadas, o tempo que engenheiros levaram para estudar as correntes de vento da avenida até ter certeza que as placas não tombariam sobre gente —uma peça do americano já  desabou e matou um operário— nem sobre os prédios.

Serra, um dos maiores nomes da arte contemporânea, é da geração de autores que despontou na década de 1960 e então redefiniu a ideia de escultura, a maioria deles homens que fizeram de suas obras um desafio à escala da paisagem. Deixaram marcas gigantescas no horizonte, em rios, desertos, campos e praias, a chamada ‘land art.


Caminhão transporta lâminas de aço da escultura 'Echo' 


Mas não são monumentos. ‘É equivocado falar em monumentalidade em relação ao meu trabalho’, ele afirma. ‘Monumentos elogiam uma pessoa, um lugar, um acontecimento. Uma escultura em grande escala não significa monumentalidade’.

No caso de Serra, são obras que não expressam mais que o impacto acachapante do próprio peso, a força da matéria pura como espetáculo.

 ‘O peso é um valor para mim’, diz. ‘Não é mais convincente do que a leveza, mas tenho mais a dizer sobre o equilíbrio do peso, a concentração do peso, o posicionamento do peso, os efeitos psicológicos do peso, a rotação do peso, a desorientação do peso’.


O artista plástico americano Richard Serra, 74


Toneladas à parte, Serra reconhece nessa nova escultura o efeito contrário. ‘A verticalidade faz o trabalho parecer mais leve que sua massa’, diz. ‘E a experiência da escultura vista do chão é inquietante por causa da agitação que ocorre ao olhar para cima’.

Ele fala da vertigem causada pelas placas, que se tornam blocos um tanto ameaçadores quando vistos contra o céu da cidade. Do quinto andar do Instituto Moreira Salles, no entanto, são só obstáculos meio carrancudos retalhando a vista da metrópole.

Muito antes de mover carregamentos mastodônticos de metal para forjar essas peças que já encheram o Grand Palais, em Paris, o Guggenheim de Bilbao, na Espanha, e praças públicas mundo afora, Serra já tentava traduzir a ideia de movimento mesmo em suas obras um tanto estáticas.

Os nomes de suas primeiras esculturas, por exemplo, eram verbos. Rolar, cortar, arremessar, escorar foram algumas das ações que embasaram as peças dos primórdios de seu trabalho. Num filme da mesma década de 1960, ele mostra mãos tentando agarrar um pedaço de chumbo em queda livre, tornando visível o atrito entre as ideias de peso e leveza, imobilidade e movimento, que embasam toda escultura.

Mais tarde, já na fase mais espetacular de sua obra, a preocupação com o movimento se desloca das peças para o corpo do espectador, que adentra seus labirintos metálicos. ‘O movimento corporal pela escultura é uma premissa básica do meu trabalho’, diz.

Serra nega, no entanto, uma dimensão política desse caminhar. Mesmo já tendo criticado em cartazes os abusos políticos do governo americano na Guerra do Iraque, e fazendo questão de chamar o presidente Donald Trump de ‘mentiroso patológico’ e ‘ditador narcisista’, ele diz que seria exagero pensar a forma como suas obras ditam os passos do público como metáfora para um comentário político qualquer.

‘Isso seria hiperbólico’, diz o homem que passou suas mais de oito décadas de vida pensando e construindo coisas muito maiores do que ela.


RICHARD SERRA
Quando Ter., qua. e sex. a dom.: 10h às 20h. Qui.: 10h às 22h. Abre sáb. (23)
Onde IMS - av. Paulista, 2.424, tel. (11) 2842-9120
Preço Grátis







Fonte: Silas Martí   |   FSP



(JA, Fev19)



quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Millôr tem obra gráfica reunida em exposição


Instituto Moreira Salles, que guarda acervo e arquivo do desenhista, mostra 500 originais
Primeira retrospectiva dedicada aos desenhos do humorista, dramaturgo e tradutor carioca Millôr Fernandes, 1923-2012, a exposição que o Instituto Moreira Salles (IMS) aberta no último dia 18, reúne 500 dos mais de 6 mil originais sob a guarda da entidade desde 2013. A mostra, ‘Millôr: Obra Gráfica’, que tem como curadores Cássio Loredano, Julia Kovensky e Paulo Roberto Pires, destaca os principais temas abordados por Millôr em 70 anos de produção, sendo o marco zero a coluna Pif-Paf, publicada na revista O Cruzeiro, entre 1945 e 1963.
A exposição foi organizada levando em conta esses temas recorrentes na obra de Millôr. Assim, os curadores a dividiram em cinco núcleos: os desenhos autor referenciais, o processo embrionário do humorista, que começou escrevendo o texto ilustrado por Péricles em Pif-Paf, sua visão do Brasil com todas as suas contradições (nos núcleos Brasil e Condição Humana) e as obras essencialmente visuais, que não têm o propósito de servir de comentário político, como era comum no trabalho de Millôr.


Crítico. No desenho, Millôr comenta a luta de classes no Brasil  
O humor gráfico do artista foi marcado por sua visão aguda da política brasileira. Millôr trabalhou para os principais veículos da grande imprensa (Jornal do Brasil, Veja) e participou ativamente do mais popular tabloide publicado durante a ditadura (O Pasquim). No livro que acompanha a mostra, o segundo a examinar a obra do artista (o primeiro, Desenhos, é de 1981), o recorte é diferente, mais variado. De qualquer modo, o assunto principal é o próprio Millôr e sua relação com o mundo – o que não surpreende, em se tratando de um artista que não fazia autorretratos como autoanálise, como Rembrandt, mas por puro egocentrismo.

Cássio Loredano, apontando para um desenho na exposição que mostra Millôr assistindo ao nascer de um novo dia, chama a atenção para os elementos que confirmam essa irresistível vocação cabotina: Millôr é o próprio sol, o pão de cada dia, ‘o alimento e a luz’ que oferece ao leitor. ‘Ele era mesmo vaidoso, sabia qual era seu tamanho’, define Cássio, comentando a sofisticação do seu traço e sua inteligência visual. Seu desenho, de fato, exige um espectador erudito, capaz de identificar citações a Mondrian, Picasso, Pollock, Steinberg e ao brasileiro Willys de Castro – uma série de quatro desenhos na mostra evoca o esquema dos objetos ativos do artista neoconcreto.


A ambição intelectual de Millôr não se restringiu às artes visuais – ele foi dramaturgo e tradutor de autores como Shakespeare e Fassbinder. O outro curador da mostra, Paulo Roberto Pires, lembra que o desenhista lutou contra as adversidades de uma vida marcada pela ‘infância dura’ no subúrbio carioca do Méier. Basicamente, foi um autodidata com uma breve passagem pelo Liceu de Artes e Ofícios. Trabalhando na revista O Cruzeiro como contínuo, aos 14 anos, aproveitou a convivência com jornalistas e veio a se tornar uma referência no meio. Ganhou autonomia nos 18 anos em que escreveu a coluna Pif-Paf, publicando sem censura (até 1963) sob o pseudônimo Vão Gogo, clara alusão ao gênio holandês da pintura Vincent Van Gogh.
Entre as peças preciosas da mostra está a reprodução de um pedido de desculpas dos editores de O Cruzeiro a leitores furiosos com uma sátira de 12 páginas da história bíblica da criação do mundo feita por Millôr em 1963. Indignado, ele transformou a Pif-Paf numa revista independente justamente às vésperas do golpe militar de 1964. Desnecessário dizer que durou pouco. O resto da história é mais ou menos conhecido. Millôr foi um dos humoristas mais censurados durante a ditadura – e há vários exemplos na exposição de ilustrações proibidas de circular pelo regime, riscadas com um enérgico ‘x’ dos censores.
Interdito. O paraíso de Millôr foi abjurado pela direção de 'O Cruzeiro

Todo esse material, conta a coordenadora da área de iconografia do IMS, Julia Kovensky, só está hoje disponível ao grande público porque Millôr, ao morrer, vítima das consequências de um acidente vascular cerebral, deixou como legado 94 volumes que reúnem material publicado em jornais como O Estado e revistas como O Cruzeiro e Veja.
Entre os 500 desenhos expostos no IMS, evidentemente os políticos, inspirados pelos absurdos do regime militar, se destacam, embora as obras mais autônomas, que dispensam uma narrativa, sejam as que definem a excelência do traço de Millôr. 



Fonte: Antônio Gonçalves Filho  |  OESP

(JA, Set18)



quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Cerca de 300 fotografias espelham carreira de Chichico Alkmin no IMS



Ao longo de quatro décadas, Chichico Alkmim (1886-1978) fotografou.
Integrante de uma geração de retratistas, ele transmitia sua linguagem com ‘olhar de pintor’, em imagens que se assemelham a ‘pinturas renascentistas’.
Assim Eucanaã Ferraz, curador de mostra com cerca de 300 imagens que chega a São Paulo, após passagem pela sede carioca do IMS, define o trabalho do fotógrafo.
A mostra começa com retratos que remetem ao ateliê de Chichico e segue com fotografias de Diamantina, em que estão representados o comércio, a indústria, o garimpo e as festas populares.
Alkmim se instalou na cidade mineira em 1912, depois de viajar pela região vendendo joias com seu pai.
Nos retratos apresentados no início da exposição, é notável a preocupação dos fotografados em aparecerem bem vestidos independentemente da classe social.
O fundo das imagens mostra paisagens pintadas como cenários. ‘Era a sua tentativa de montar um estúdio’, explica Ferraz.
Em seguida, a mostra segue fotos ao aberto. Mesmo fora do estúdio, Alkmim não perde sua marca registrada; fotos posadas contra algum cenário ou pano de fundo são quase sempre a regra.
Em algumas fotografias, nota-se a presença de flores nos trajes das pessoas fotografadas. ‘É uma vontade de compor algo anticonvencional’, diz o curador.
Outra característica é a constante presença de crianças nos cliques do fotógrafos. Algumas mostram contrastes sociais do período.
Em uma época que o uso sapato denotava distinção de classe, o elemento do vestuário deixa perceber que Alkmim contemplava desde as classes mais abastadas aos mais pobres em seus retratos.
‘Nem todas as crianças usavam sapato, e as que usavam as vezes usavam em só um pé para não gastar’, explica o curador.
De acordo com Ferraz, estudos mostram que Alkmim não cobrava de algumas pessoas, e as fotografava em troca de um pedaço de rapadura ou de uma galinha.
‘Era uma coisa completamente doméstica’, diz Ferraz. ‘Ao mesmo tempo, ele foi se tornando um exímio artista da luz, das texturas, da composição que era uma coisa indisponível da época’.
Em um espaço anexo ao corpo da exposição, em uma pequena sala, são expostos materiais que o fotógrafo utilizava na época, como negativos de vidro e imagens impressas pelo artista.
A mostra contém também uma máquina fotográfica que se assemelha à que Alkmim utilizava na época; ao seu lado, há uma explicação sobre o funcionamento do equipamento.
ANJINHOS
Nas fotos que contemplam as festas populares, ele também retratava os ‘anjinhos’, como eram chamadas as crianças que morriam.
‘Ele foi um dos últimos a fotografar essas cerimônias’, nas quais as crianças eram vestidas de anjos. ‘São fotos impactantes’, define Ferraz sobre a série que mostra pais velando os filhos assim representados.
‘Acreditava-se na pureza de quem teve a chance de morrer criança e, portanto, ser um anjo. Sendo um anjo, a crença era que a criança poderia interceder em favor dos seus familiares’.
*

CHICHICO ALKMIM, FOTÓGRAFO
QUANDO até 15/4; ter. e qua. a dom. das 10h às 20h e qui. das 10h às 22h
ONDE Instituto Moreira Salles, av. Paulista, 2.424
QUANTO entrada gratuita


Texto: Isabella Menon   |   FSP
Imagem: Homens de Diamantina posam para foto em parque, 1945 



(JA, Jan18)