Obras estarão na mostra
'Ai Weiwei Raiz' na Oca, em outubro
Abacaxis feitos de porcelana em fábrica de São Caetano do Sul para projeto do chinês Ai Weiwei |
Nas
prateleiras cheias de objetos de porcelana em um galpão de São Caetano do Sul,
no ABC, algumas peças parecem fora de contexto. Entre xícaras, cinzeiros e
budas decorativos, repousam centenas de réplicas de frutas-do-conde, ostras,
dendês e abacaxis.
Os frutos
aguardam o momento em que, pelas mãos de uma equipe coordenada pela designer
Raquel Hoshino, serão diferenciadas de uma xícara de cafezinho para se tornarem
obras assinadas pelo artista plástico Ai Weiwei.
A Porcelana
Teixeira, fábrica fundada em 1949 por imigrantes portugueses, abriga atualmente
um dos cinco ateliês que o famoso dissidente chinês montou no país este ano.
Do galpão
sairão os dois exemplares de ‘F.O.D.A.’ (fruta-do-conde, ostra, dendê e
abacaxi) que o público verá no prédio redondo do Ibirapuera, além de outros 300
múltiplos da mesma obra que serão vendidos pela sua galeria paulistana, a
ArtEEdições.
‘Ai Weiwei
eterniza as frutas da mesma forma que a burguesia europeia eternizava cachorros
em bibelôs de porcelana. A ideia do bibelô é manter presente algo que está em
extinção’, explica Hoshino.
Peças de porcelana no ateliê em São Caetano do Sul |
Sete pessoas
se dedicam em tempo integral ao acabamento das frutas —são escultores,
ceramistas e pintores ativos no mercado, pinçados especialmente para o projeto.
A fabricação
dos objetos segue a linha de produção normal de outras peças que saem dali, com
os mesmos operários e matérias-primas.
Weiwei
contratou Hoshino depois de se encantar com a verossimilhança de um protótipo
de abacate realizado pelo artesão Miguel Anselmo, que integra a equipe da
designer.
A encomenda
do artista chinês, que pediu a Hoshino e à fábrica a reprodução de uma fruta
brasileira, para aferir a qualidade do trabalho e dos materiais, fez com que a
designer oficializasse a criação de uma divisão dedicada ao desenvolvimento de
peças de caráter mais experimental.
Ela conta
ainda que Weiwei lhe mandou um recado —ele queria que as reproduções das frutas
fossem ‘rústicas, mas benfeitas’. E parece ter gostado do resultado, a julgar
pelas curtidas que dá nas imagens das peças prontas postadas no Instagram por
um dos artesãos da fábrica.
O curador da
mostra da Oca, Marcello Dantas, conta que a ideia para ‘F.O.D.A.’ surgiu há
alguns meses, em Trancoso, na Bahia, onde Weiwei lhe perguntou como dizer ‘fuck’
em português. Dantas respondeu, e então o artista disse que queria uma fruta
correspondente a cada letra da palavra ‘foda’ para realizar a obra.
‘As letras
F, D e A foram relativamente fáceis. Mas não há no dicionário nenhuma fruta com
O. Então sugeri ostra, que é um fruto do mar, e ele amou. Além do mais, a ostra
tem uma conotação sexual superforte’, afirma Dantas.
Moldes das peças de porcelana
.
A fábrica em São Caetano do Sul é só um dos lugares de produção do chinês no Brasil.
Há mais três
frentes de trabalho ativas espalhadas pelo país —uma em Cotia, na Grande São
Paulo, outra em Juazeiro do Norte, no Ceará, e uma no presídio paulista de
Tremembé. O quarto, que ficava em Trancoso, foi desativado após seis meses de
operação.
O número de
pessoas trabalhando em todos esses locais chegou a 150. Para a realização das
obras, foram usados materiais como raízes, cerca de uma tonelada de sementes de
olho-de-cabra e couro. ‘O volume de produção é grande. São uns sete, oito
caminhões. É um processo quase industrial’, conta Dantas.
Processo (da esq. para dir.) de fabricação das frutas em porcelana na fábrica |
O restante
foi enviado à China e só virá a público em ocasiões futuras. É o caso do molde
de um pé de pequi de 36 metros de altura tirado em Trancoso por uma equipe de
chineses, que deve levar cerca de um ano para ser fundido.
Dantas nega
que o interesse de produzir as peças de ‘F.O.D.A.’ no Brasil esteja relacionado
à mudança nas taxas aeroportuárias para obras importadas; hoje elas não são
mais cobradas de acordo com o peso da obra armazenada, e sim segundo seu valor.
‘A fábrica
em São Caetano do Sul é só um dos lugares de produção do chinês no Brasil. Há
mais três frentes de trabalho ativas espalhadas pelo país —uma em Cotia, na
Grande São Paulo, outra em Juazeiro do Norte, no Ceará, e uma no presídio
paulista de Tremembé. O quarto, que ficava em Trancoso, foi desativado após
seis meses de operação.
O número de
pessoas trabalhando em todos esses locais chegou a 150. Para a realização das
obras, foram usados materiais como raízes, cerca de uma tonelada de sementes de
olho-de-cabra e couro. "O volume de produção é grande. São uns sete, oito
caminhões. É um processo quase industrial", conta Dantas.
Parte das
obras vindas dos ateliês, que devem finalizar seus trabalhos no início de
setembro, estará na Oca.
O restante
foi enviado à China e só virá a público em ocasiões futuras. É o caso do molde
de um pé de pequi de 36 metros de altura tirado em Trancoso por uma equipe de
chineses, que deve levar cerca de um ano para ser fundido.
Dantas nega
que o interesse de produzir as peças de "F.O.D.A." no Brasil esteja
relacionado à mudança nas taxas aeroportuárias para obras importadas; hoje elas
não são mais cobradas de acordo com o peso da obra armazenada, e sim segundo
seu valor.
‘A razão de
produzir essas peças aqui é o interesse em interpretar o Brasil que faz parte
do imaginário do Ai Weiwei desde a infância, quando seu pai aqui esteve com
Jorge Amado. É uma visita à tradição artesanal brasileira, assim como a obra do
Weiwei é uma visita à tradição artesanal chinesa’, justifica o curador.
Obras
complexas realizadas com o auxílio de mão de obra local, aliás, não são uma
novidade na carreira do dissidente.
Há alguns
anos, Weiwei contratou oficinas de artesãos de Jingdezhen para que
confeccionassem 100 milhões de sementes de girassol de porcelana —a cidade no
sul da China tem tradição milenar na fabricação desse material.
O resultado
foi ‘Sunflower Seeds’, obra exibida há oito anos na Tate, em Londres, que
estará também em São Paulo.
‘Ai Weiwei
Raiz’ é a segunda mostra do artista no país. Em 2013, um conjunto de suas
fotografias foi exibido no Museu da Imagem e do Som paulistano. Esta, contudo,
terá uma dimensão maior, ocupando quatro andares da Oca.
Além das
peças feitas aqui, estarão reunidos trabalhos marcantes de Weiwei, como ‘Forever
Bicycles’, ‘Moon Chest’ e ‘Straight’, além de uma obra exibida apenas uma vez, ‘Ordos
100’, realizada em 2008 com os arquitetos suíços Herzog & de Meuron.
Fonte: João
Perassolo | FSP
(JA, Ago18)