Mostra gratuita no CCBB do Rio de
Janeiro ficará aberta até 29 de abril
No centro da sala, reina
iluminada uma das poucas peças que não estão protegidas por um vidro: o Trono
de Daomé, um presente do reino africano que existiu até cerca de 1900, onde
hoje fica o Benin, à família real brasileira.
Mas esse não é de madeira, e
sim de papel machê. Também não foi doado por um
rei, mas por um menino de 11 anos do Rio de Janeiro que fez o objeto com as
próprias mãos ao saber que o original, exposto no Museu Nacional, foi consumido
pelo incêndio que atingiu o prédio em setembro do ano passado.
O presente do aluno Miguel
Nunes, que fez os pesquisadores do museu chorarem, é um símbolo do que a
instituição quer a partir de agora, ao inaugurar uma exposição com mais de cem
itens achados em meio aos escombros —aproximar os brasileiros de um acervo
científico e cultural que é público.
A mostra ‘Museu Nacional Vive
- Arqueologia do Resgate’ foi aberta na última quarta-feira (27) gratuitamente, no Centro
Cultural Banco do Brasil, no centro do Rio. Durante o Carnaval, a exposição
estará fechada na segunda (4) e na terça (5). Na quarta (6), abrirá a partir do
meio-dia.
Ela fica em cartaz até 29 de
abril e acontece quase seis meses depois da tragédia, que ainda não teve
investigações concluídas pela Polícia Federal. Das 170 peças exibidas, 103
estavam no edifício no dia em que ele pegou fogo. Muitas delas ficaram inteiras
e outras, parcialmente danificadas.
Coleções de antropologia,
botânica, entomologia (estudo de insetos), etnologia (estudo de culturas)
geologia, paleontologia, invertebrados e vertebrados fazem parte da exposição.
Está ali, por exemplo, uma reprodução do famoso crânio da Luzia, esqueleto
humano mais antigo descoberto na América.
Panelas de cerâmica dos Waujá, do Xingu, bonecas de cerâmica do povo Karajá, de Goiás |
Há ainda as bonecas Karajá,
cerâmicas feitas por mulheres indígenas no século 20 e consideradas patrimônio
imaterial brasileiro. O também conhecido Bendegó, maior meteorito já encontrado
no Brasil, de cinco toneladas, não está na mostra e resistiu na entrada do
Museu Nacional.
Entre os itens que ainda não
haviam sido apresentados estão fósseis de plantas, o fêmur de um mastodonte
pré-histórico, a cabeça de um crocodilo, peças africanas e partes do prédio do
prédio, como uma viga de metal retorcida e fragmentos das estátuas de musas que
ficavam no alto do palácio.
Algumas peças trazem a própria
história do incêndio. É o caso de pequenas mantas de algodão com insetos secos
que ficaram pretas por causa do fogo e foram achadas em bairros vizinhos ao
museu, localizado em São Cristóvão (zona norte). Uma delas, por exemplo, foi
lançada pelas chamas até a Tijuca, a mais de um quilômetro.
Dois fragmentos de ninhos de
vespas, feitos de barro e portanto resistentes, também chamam a atenção.
Retorcidos pelo fogo, eles foram os únicos que sobraram da imensa coleção
entomológica que ficava no edifício. Pequenos potes com sílica, uma areia
lilás, ficam próximos a algumas peças para retirar a umidade.
Para o diretor do museu,
Alexander Kellner, a mostra é uma espécie de ‘prestação de contas para a
sociedade’ do dinheiro que está sendo investido --serão cerca de R$ 85 milhões
neste ano, vindos principalmente do governo federal.
Ele afirma que busca
parcerias para levar a mostra para outros locais. Ela custou R$ 230 mil e foi
idealizada e inteiramente custeada pelo Centro Cultural Banco do Brasil,
segundo o diretor-geral Marcelo Fernandes.
Paleontóloga Luciana de Carvalho da equipe de resgate do acervo do Museu Nacional |
‘O que a gente está mostrando
não é o total do que a gente conseguiu resgatar, é apenas uma pequena parcela
dos tesouros do Museu Nacional. E essa pequena parcela não representa nada
perante o enorme potencial que a gente ainda tem’, disse Kellner. ‘Precisamos
de mais espaço, de mais contêineres [para recuperação do acervo], de mais
verbas’.
Esta é a segunda exposição
que terá itens resgatados. A primeira, ‘Quando Nem Tudo Era Gelo - Novas
Descobertas no Continente Antártico’, foi inaugurada em janeiro no Palacete da
Casa da Moeda, também no centro do Rio, e traz oito peças recuperadas, como
fragmentos de troncos de árvores fossilizados que ficaram cobertos por pedaços
de metal de um armário que derreteu com as chamas. Essa exibição, que vai até
17 de maio, estava sendo planejada antes da tragédia para acontecer em uma das
salas do Museu Nacional, mas o incêndio fez os planos mudarem.
No total já foram catalogados
mais de 2.000 itens achados nos escombros, mas ainda não há uma estimativa do
que isso representa em termos percentuais. Vários desses objetos podem ser
fragmentos de uma peça só, e entre eles há equipamentos, itens pessoais e
fragmentos arquitetônicos.
Essas unidades foram
resgatadas por uma equipe de 60 pesquisadores do próprio museu, que nos últimos
meses têm entrado em cada sala do prédio bicentenário junto com operários da
empresa Concrejato --contratada pela UFRJ (Universidade Federal do RJ) para
reforçar a estrutura do prédio.
Os trabalhos de busca do
acervo ainda devem durar até o final do ano, mas as obras de reforço do
edifício e instalação de um teto provisório estão previstas para acabar em
março.
Os objetos vão sendo
coletados, encaminhados para a triagem, catalogados, estabilizados (processo
para evitar sua deterioração) e depois restaurados, tudo isso em cerca de 20
contêineres montados do lado de fora do museu —a instituição diz que precisa do
dobro.
O acervo tinha no total mais
de 20 milhões de peças, incluindo o que não foi atingido pelo incêndio. As
coleções de invertebrados, vertebrados e de botânica eram algumas das que
estavam armazenadas em prédios anexos.
Desde dezembro, quem não
conheceu o Museu Nacional também pode circular virtualmente por suas principais
salas e coleções em uma visita online guiada com imagens capturadas pela
plataforma Google Street View antes da tragédia.
Exposição
‘Museu Nacional Vive – Arqueologia do resgate’
Onde Centro Cultural Banco do Brasil - RJ (r. Primeiro
de Março, 66, Centro - Rio de Janeiro)
Quando 27 de fevereiro a 29 de abril de 2019
Horário De quarta a segunda, das 9h às 21h
No Carnaval Não abre segunda (4) nem terça (5); na
quarta (6), só às 12h
Quanto Grátis
Fonte: Júlia Barbon | FSP
(JA, Fev19)