Exposição ‘Gala
Salvador Dalí - um quarto para si em Púbol’ é apresentada no Museu Nacional de
Arte da Catalunha até outubro de 2018
Gala com chapéu e sapato inspirado desenho de Salvador de 1938, André Caileet |
Nascida em
1894 na cidade de Kazan, na Rússia, Elena Ivanovna Diakonova é mais conhecida
como Gala Dalí. Ela passou a ser chamada por esse nome após se casar com o
pintor surrealista espanhol Salvador Dalí, em 1934 e, frequentemente, é
descrita como ‘musa’ de surrealistas.
Agora, uma nova exposição no Museu Nacional de
Arte da Catalunha, em Barcelona, busca mostrá-la como um personagem mais
complexo, com uma produção própria e influência sobre o movimento artístico em
que se inseria, apesar dos obstáculos que enfrentava como mulher.
Inaugurada
no dia 6 de julho, a exposição é intitulada “Gala Salvador Dalí - um quarto
para si em Púbol”, em referência à cidade onde Gala se estabeleceu durante a
maior parte de sua vida e a um ensaio da escritora britânica Virginia Woolf,
segundo o qual uma mulher precisava ter seu próprio dinheiro e seu próprio
quarto.
Ela ocorre
até 14 de outubro de 2018 e inclui representações de Gala criadas por artistas
surrealistas, como Max Ernst, Man Ray, Cecil Beaton e, principalmente, o
próprio Salvador Dalí, além de roupas, cartões postais e livros.
Em nota à
imprensa, a curadoria da exposição afirma que apresenta Gala Dalí como ‘musa e
artista, assim como figura-chave na arte do século 20’.
“Representações suas em pinturas por Max Ernst, em fotografias por Man Ray, Cecil Beaton e, especialmente, em trabalhos por Salvador Dalí, são muito mais que retratos: elas tratam de uma odisseia autobiográfica em que Gala imaginava e criava sua própria imagem -como uma verdadeira heroína pós-moderna”.
Nota à imprensa sobre a exposição ‘Gala Salvador Dalí - um quarto para si mesmo em Púbol’
Gala Placidia, Galatea das esferas, de 1952, por Salvador Dalí |
Quem foi
Gala Dalí Gala cresceu em uma família de seis pessoas em Moscowand, com dois
irmãos mais velhos, Vadim e Nicolai, e uma irmã mais nova, Lidia. Aos 11 anos,
seu pai morreu, levando sua mãe a se casar novamente com um advogado que
contribuiu para sua formação intelectual, apresentando a ela romancistas e
poetas russos.
Ela passou parte
de sua adolescência em Moscou. Aos 17 anos, foi passar uma temporada em um
sanatório na Suíça, sob suspeita de tuberculose -doença que faria com que
passasse períodos afastada de casa ao longo da vida.
Lá, conheceu
o jovem francês Eugène Émile Paul Grindel, que posteriormente produziria
poesias com a alcunha de Paul Éluard. Éluard foi um dos fundadores do
surrealismo, e é considerado um dos poetas mais amados do movimento.
A jovem Gala
Dalí convenceu seus pais e os de Éluard a permitirem que ela passasse a viver
com o jovem poeta. Os dois se casaram em 1917 em Paris, durante a Primeira
Guerra Mundial. A filha do casal, Cécile, nasceu em 1918.
Ambos
aderiram ao então nascente movimento surrealista, no seio do qual Gala travou
amizades com personalidades como os escritores franceses René Crevel e René
Char, e teve um caso com o pintor, escultor e artista gráfico alemão Max Ernst
em 1922.
Uma
reportagem publicada em julho de 2018 no site da Smithsonian Magazine destaca
que Gala é uma das duas únicas mulheres representadas no quadro ‘Uma reunião de
amigos’, pintado naquele ano por Ernst, representando as principais figuras
surrealistas da época. Ela também foi fotografada por figuras como Man Ray,
Eric Schaal e Brassaï.
Ernst Gala - Reunião entre amigos, 1922 |
O movimento
foi composto principalmente por homens, que se mostravam refratários à inserção
de mulheres. Gala, no entanto, participava de eventos surrealistas, como
sessões de desenho, e chegou a produzir objetos surrealistas, roupas e textos
-a maioria dos quais se perdeu.
Em 1929,
Gala e Éluard viajaram à Espanha, onde conheceram o então artista emergente
Salvador Dalí, cinco anos mais jovem que Gala. Apaixonada, ela abandonou a
filha e o marido, e passou a viver com o pintor na cidade de Cadaqués. Eles se
casaram cinco anos depois.
Durante e
depois de sua vida, Gala foi frequentemente descrita como uma mulher forte, uma
alpinista social ávida por dinheiro que exercia uma poderosa influência sobre o
talentoso Salvador Dalí.
Em
entrevista publicada em julho de 2018 no The Art Newspaper, no entanto, o
curador da exposição dedicada a Gala, Estrella de Diego, afirma que a atitude
que tomou em 1929, de abandonar a vida ao lado de um poeta reconhecido de
família rica e passar a se dedicar a um novo esposo pouco conhecido em uma vila
remota da região da Catalunha contradiz essa imagem.
De Diego
acredita que Gala se dispôs a embarcar com Salvador em um projeto conjunto no
qual transformaram suas próprias vidas em uma obra de arte.
Diversos
amigos acreditavam que o pintor continuava virgem quando se casou. A relação
peculiar com a sexualidade é um traço conhecido do pintor -relata-se que ele
tinha, em geral, aversão ao contato físico e preferência pelo papel de voyeur.
Gala e Dalí trabalhando exposição 'Dream of Venus', 1939 - foto Eric Schaal |
Dalí resumiu
sua admiração pela esposa em uma frase famosa: ‘Eu nomeio minha esposa: Gala,
Galushka, Gradiva [este último em referência à heroína mitológica que serve de
força motriz no romance homônimo por Wilhelm Jensen]; Oliva, pela forma oval de
seu rosto e pela cor de sua pele; Oliveta, como diminutivo de Oliva; e seus
derivativos delirantes Oliueta, Oriueta, Buribeta, Buriueteta, Suliueta,
Suliueta, Solibubuleta, Oliburibuleta, Ciueta, Liueta. Também a chamo de
Lionette, porque quando ela fica brava ela ruge como o leão da
Metro-Goldwyn-Mayer’.
Gala foi
tema de vários retratos pintados por Dalí, a quem servia como interlocutora,
referência e agente, responsável por negociar com galeristas e outros
compradores. Salvador chegou a assinar diversos de seus trabalhos como ‘Gala
Dalí’, em reconhecimento à influência mútua entre ambos.
Em 1939, ela
participou da construção da instalação ‘Dream of Venus’, para a Feira Mundial
de Nova York. Tratava-se de uma casa surrealista, pontuada por figuras e
estátuas femininas, incluindo um par de pernas aberto como porta de entrada.
Dali's Dream of Venus 1939 World's Fair
Em 1969,
Salvador Dalí presenteou Gala com um castelo em mau estado na vila de Púbol, na
Catalunha. Gala aceitou o presente e passou a residir no local, mas estabeleceu
regras sobre como os dois se relacionariam: seu marido poderia visitá-la apenas
após ser convidado por escrito. Ela delimitava assim o seu ‘próprio quarto’ a
que o nome da exposição se refere.
Segundo
reportagem do jornal americano The New York Times, Salvador aceitou as
condições com certo entusiasmo, afirmando que ‘rigor sentimental e distância -
como demonstrado pela cerimônia neurótica do amor cortês - aumentam a paixão’.
Gala
implementou no local uma decoração que lembrava sua juventude na Rússia,
incluindo objetos, fotografias e uma biblioteca em cirílico. A estrutura também
pode ser lida como uma obra conjunta dela e de seu marido, que contribuiu com
ideias e trabalhos, incluindo brasões com a letra ‘G’.
The Madonna of Portlligat, 1ª versão, 1949, Salvador Dali |
Com a
liberdade que obteve no local, Gala viveu vários romances com homens mais
jovens.
Ela morreu
em 1982 em Púbol, e foi enterrada em uma cripta em seu castelo, projetada por
seu marido de forma a se assemelhar a um jogo de xadrez. Na nota à imprensa
sobre a exposição em seu nome, o diretor do museu Dalí, Montse Aguer afirma que
Gala ‘sempre se sentiu mais confortável nas sombras, mas, como seu marido,
sempre desejou se tornar uma lenda algum dia’.
Na avaliação
da reportagem do The New York Times, a exposição mostra como ela teve sucesso,
à sua maneira, em ‘encontrar seu lugar no movimento Surrealista que, de outra
maneira, dava pouco espaço às mulheres’.
Gala sintomas rinocerônticos, 1954, Salvador Dali |
Fonte: André Cabette Fábio |
NexoJornal
(JA, Ago18)
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