Netos dos artistas tiveram a ideia de
juntar as criações do pai do cubismo com as do escultor americano
A relação entre as obras do
espanhol Pablo Picasso (1881-1973) e do americano Alexander Calder (1898-1976)
com o vazio é o fio condutor de uma mostra recém-aberta no Museu Picasso, em
Paris.
A ideia de juntar as criações
do pai do cubismo com as do escultor que se celebrizou pelos ‘móbiles’ que
parecem desafiar a gravidade partiu de dois netos dos artistas, Alexander S. C.
Rower e Bernard Ruiz-Picasso, e já havia ganhado uma primeira encarnação em
2016, em Nova York.
Agora, um conjunto de cerca
de 120 obras busca retraçar a investigação do vácuo, da ausência de matéria que
ambos empreenderam, cada um à sua maneira.
Picasso e Calder se
conheceram em 1931, na abertura de uma exposição do americano na capital
francesa, e só voltariam a se ver mais três vezes.
Apesar da distância,
compartilhavam preocupações estéticas (como a busca pela forma mais potente de
representar o movimento), e políticas (os dois apoiaram os republicanos na
Guerra Civil Espanhola e criaram obras embebidas dessa convicção progressista,
respectivamente, ‘Guernica’ e ‘Fonte de Mercúrio’).
Em Calder, a inclinação
minimalista já se manifesta no começo da carreira, nos anos 1920, em trabalhos
ainda figurativos e menos conhecidos do grande público, porém de grande força
expressiva.
É o caso dos ‘retratos no
espaço’ que dedica à dançarina Josephine Baker, esculturas suspensas feitas com
fios de ferro, e nada mais. Do mesmo conjunto faz parte uma Medusa delineada
com economia e uma releitura da luta de Hércules com um leão.
Na década seguinte, Calder
mergulhará de vez na abstração, primeiro com objetos cinéticos motorizados, mas
deixando suas obras ondularem ao sabor do vento e da curiosidade e proximidade
humana.
De seu lado, Picasso busca a
forma pura, essencial, espécie de átomo da representação.
Propõe-se a encapsular tempo
e movimento pela sobreposição de perspectivas, logo subtraídas, simplificadas,
até se reduzirem aos pontos e linhas que um dia, segundo ele, surpreenderam
adeptos do surrealismo que bisbilhotavam seu caderno de croquis.
‘Admiro os mapas
astronômicos. Parecem-me bonitos para além de seu significado ideológico’,
diria o espanhol.
Na exposição, esse anseio de
síntese fica evidente na série de 11 litogravuras (realizada entre 1945 e 1946)
em que Picasso vai paulatinamente transmutando um touro figurativo em uma quase
fantasmagoria animal, uma memória desencarnada cada vez mais geométrica,
angulosa.
Já dos anos 1950, em outra
sala, comparecem as esculturas longilíneas da série ‘Banhistas’, feitas com
restos de estrados, pedaços de madeira, cabos de vassoura. Suas silhuetas de
sílfide são atravessadas pela luz (no momento da criação, a da Côte d'Azur) e pelo nada.
Calder-Picasso
Museu Picasso, em Paris. Até 25/8
Fonte: Lucas Neves
| FSP
(JA, Fev19)
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