Museu transforma capital de Estado australiano em destino
descolado
Vista externa do Mona (Museum of Old and New Art), em
Hobart, capital da Tasmânia
TASMÂNIA
O maior museu
particular do hemisfério Sul é também um dos mais polêmicos. Descrito por seu
proprietário como a ‘Disneylândia adulta e subversiva’, o MONA (Museum of Old
and New Art, museu da arte antiga e nova) poderia convulsionar o Brasil com
polêmicas sobre nudez.
Mas o espaço
fica do outro lado do mundo, na distante Tasmânia, o Estado mais ao sul da
Austrália.
Nada nele é
comum, e tudo é feito para chocar, a começar por sua localização e arquitetura.
Construído num vinhedo à beira do rio Derwent, o prédio moderno de concreto e
ferro pesa na paisagem local. O contraste, no entanto, é fascinante.
Suas obras de
arte não são expostas em galerias tradicionais, mas em labirintos que lembram
os desenhos do artista holandês M. C. Escher, 1898-1972. A intenção é criar um
ambiente ‘antimuseu’ O MONA tem um pouco de tudo, mas a temática central é sexo
e morte.
Logo na
entrada, uma réplica de um Porsche gordo e vermelho critica a relação entre
carros e obesidade e o consumo exagerado dos dias de hoje. Esse é um aperitivo
do tom crítico que marca a maioria das exposições do lugar.
A máquina
Cloaca Professional simula o caminho dos alimentos desde a boca até o aparelho
excretor. A exibição termina com fezes artificiais, e odor de excremento,
lembrando ao espectador sua condição animal.
Se a
escatologia não chocar, a pudicícia pode apitar na galeria das vulvas. Mais de
cem esculturas em gesso, à altura dos olhos dos observadores, exibem a
diversidade da anatomia feminina.
Em uma sala,
dois protótipos de esqueletos simulam mecanicamente o ato sexual ao som e à
imagem dos batimentos cardíacos de um feto.
As provocações
incluem uma ‘máquina de eutanásia’ e um vaso sanitário para o usuário ver o
próprio ânus.
Esculturas sem data achadas nos EUA, expostas no Mona,
em Hobart, capital da Tasmânia
Há esculturas
de animais mortos e gravuras sobre zoofilia. Quem quiser virar objeto de arte
pode desembolsar US$ 50 mil para ter suas cinzas expostas em uma das galerias,
num jazigo exótico.
Como o próprio
museu tenta explicar, ‘arte, no fim das contas, é feita e consumida por pessoas
reais e complexas, cujas motivações são geralmente obscuras, até para elas
mesmas’.
O Mona
desperta polêmica em nichos de ativismo social.
Uma exibição
de arte performática revoltou as associações protetoras dos animais. Usando
carcaça e sangue bovinos, o artista austríaco Hermann Nitsch dizia criticar a
hipocrisia humana em relação ao abate de animais.
Protestos
levaram à retirada de um aparelho que ‘testava’ Austrália - o DNA aborígene dos
visitantes. O racismo contra os nativos da Austrália é uma das questões sociais
no país.
RISCO
Mas quem teria
coragem de investir US$ 75 milhões num museu não convencional em um lugar tão
improvável?
Alguém avesso
às regras e louco por risco, como David Walsh, um australiano que enriqueceu
fazendo apostas profissionalmente. Considerado um gênio da matemática, Walsh
também é dono de um consórcio internacional de apostas que movimenta quase US$
3 bilhões por ano.
O apostador
quis investir na pequena comunidade onde cresceu com um projeto de impacto. Com
350 mil visitantes anuais, o museu fez de Hobart, a capital da Tasmânia, um
destino descolado.
Pelo
atrevimento de patrocinar uma arte provocativa quase todas as obras expostas
são de sua coleção pessoal, Walsh talvez corresse até o risco de processos
judiciais em países mais conservadores. A Austrália, ao contrário, agradeceu.
Em 2016, o país concedeu ao empresário a Ordem da Austrália, criada pela rainha
Elizabeth 2ª para condecorar cidadãos que se destaquem por mérito.
Para Walsh e
para a cidade, a indignação pública tem sido ótima para os negócios.
Texto: Solange
Reis FSP
(JA, Fev18)
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