quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Sexo e morte levam visitantes à Tasmânia


Museu transforma capital de Estado australiano em destino descolado


                   Vista externa do Mona (Museum of Old and New Art), em Hobart, capital da Tasmânia

TASMÂNIA
O maior museu particular do hemisfério Sul é também um dos mais polêmicos. Descrito por seu proprietário como a ‘Disneylândia adulta e subversiva’, o MONA (Museum of Old and New Art, museu da arte antiga e nova) poderia convulsionar o Brasil com polêmicas sobre nudez.
Mas o espaço fica do outro lado do mundo, na distante Tasmânia, o Estado mais ao sul da Austrália.
Nada nele é comum, e tudo é feito para chocar, a começar por sua localização e arquitetura. Construído num vinhedo à beira do rio Derwent, o prédio moderno de concreto e ferro pesa na paisagem local. O contraste, no entanto, é fascinante.
Suas obras de arte não são expostas em galerias tradicionais, mas em labirintos que lembram os desenhos do artista holandês M. C. Escher, 1898-1972. A intenção é criar um ambiente ‘antimuseu’ O MONA tem um pouco de tudo, mas a temática central é sexo e morte.
Logo na entrada, uma réplica de um Porsche gordo e vermelho critica a relação entre carros e obesidade e o consumo exagerado dos dias de hoje. Esse é um aperitivo do tom crítico que marca a maioria das exposições do lugar.
A máquina Cloaca Professional simula o caminho dos alimentos desde a boca até o aparelho excretor. A exibição termina com fezes artificiais, e odor de excremento, lembrando ao espectador sua condição animal.
Se a escatologia não chocar, a pudicícia pode apitar na galeria das vulvas. Mais de cem esculturas em gesso, à altura dos olhos dos observadores, exibem a diversidade da anatomia feminina.
Em uma sala, dois protótipos de esqueletos simulam mecanicamente o ato sexual ao som e à imagem dos batimentos cardíacos de um feto.
As provocações incluem uma ‘máquina de eutanásia’ e um vaso sanitário para o usuário ver o próprio ânus.

                 Esculturas sem data achadas nos EUA, expostas no Mona, em Hobart, capital da Tasmânia

Há esculturas de animais mortos e gravuras sobre zoofilia. Quem quiser virar objeto de arte pode desembolsar US$ 50 mil para ter suas cinzas expostas em uma das galerias, num jazigo exótico.
Como o próprio museu tenta explicar, ‘arte, no fim das contas, é feita e consumida por pessoas reais e complexas, cujas motivações são geralmente obscuras, até para elas mesmas’.
O Mona desperta polêmica em nichos de ativismo social.
Uma exibição de arte performática revoltou as associações protetoras dos animais. Usando carcaça e sangue bovinos, o artista austríaco Hermann Nitsch dizia criticar a hipocrisia humana em relação ao abate de animais.
Protestos levaram à retirada de um aparelho que ‘testava’ Austrália - o DNA aborígene dos visitantes. O racismo contra os nativos da Austrália é uma das questões sociais no país.
RISCO
Mas quem teria coragem de investir US$ 75 milhões num museu não convencional em um lugar tão improvável?
Alguém avesso às regras e louco por risco, como David Walsh, um australiano que enriqueceu fazendo apostas profissionalmente. Considerado um gênio da matemática, Walsh também é dono de um consórcio internacional de apostas que movimenta quase US$ 3 bilhões por ano.
O apostador quis investir na pequena comunidade onde cresceu com um projeto de impacto. Com 350 mil visitantes anuais, o museu fez de Hobart, a capital da Tasmânia, um destino descolado.
Pelo atrevimento de patrocinar uma arte provocativa quase todas as obras expostas são de sua coleção pessoal, Walsh talvez corresse até o risco de processos judiciais em países mais conservadores. A Austrália, ao contrário, agradeceu. Em 2016, o país concedeu ao empresário a Ordem da Austrália, criada pela rainha Elizabeth 2ª para condecorar cidadãos que se destaquem por mérito.
Para Walsh e para a cidade, a indignação pública tem sido ótima para os negócios.

Texto:  Solange Reis   FSP

(JA, Fev18)

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