domingo, 19 de novembro de 2017

Papel da arte na Revolução Russa - Design


DESIGN
EL LISSITZKY
Vença os brancos com a cunha vermelha, 1919 

Quando se fala em ‘construtivismo russo’, uma das associações mais corriqueiras são aos cartazes de propaganda, com slogans exaltados e estética geométrica. Principal mídia do regime bolchevique, com poder de alcance e baixo custo de produção, os cartazes contaram com inúmeros artistas envolvidos em sua produção. Entre eles, El Lissitzky (nascido Lazar Markovich Lisitskii) é um dos nomes mais representativos.
Formado em engenharia e arquitetura, Lissitzky foi convidado pelo pintor Marc Chagall para ensinar arquitetura, artes gráficas e impressão no Instituto de Arte Popular de Vitebsk, Belarus, em 1919. Na instituição, o artista conheceu Kazimir Malevich, sendo fortemente influenciado pelas suas ideias de uma arte não representativa. Lissitzky decidiu se aventurar na pintura e no desenho, fundando sua própria linha de abstracionismo, chamada Proun (projeto para a afirmação do novo, em tradução livre).
Em pouco tempo, o artista começou a realizar trabalhos de propaganda no coletivo suprematista Unovis, desenhando posters com o objetivo de encorajar trabalhadores e estimular judeus, como ele, a apoiar o regime bolchevique. El Lissitzky estava entre os que declararam naquele momento a morte da pintura. Ele voltou-se para a tipografia e as artes gráficas, que via como muito mais adequadas à realização da missão utilitária e funcional do construtivismo. Ao privilegiar formas geométricas, o artista trouxe as referências do suprematismo para materiais do dia a dia, além de dar um novo uso para seu repertório de arquiteto.

    ‘COM A CUNHA VERMELHA’

A ‘CUNHA’ OU ‘TRIÂNGULO VERMELHO’ SIMBOLIZA O EXÉRCITO VERMELHO, COMO ERAM CONHECIDAS AS FORÇAS REVOLUCIONÁRIAS BOLCHEVIQUES. AS FORMAS COM ÂNGULOS AGUDOS REPRESENTAM NO SUPREMATISMO A NOVIDADE E A MUDANÇA.
OS PEQUENOS TRIÂNGULOS E CUNHAS VERMELHAS REPRESENTAM OS EXÉRCITOS E GRUPOS MENORES QUE LUTAVAM PELA REVOLUÇÃO NO TERRITÓRIO RUSSO. A LINGUAGEM VISUAL UTILIZADA POR LISSISTZKY REMETE ÀS FORMAS USADAS EM MAPAS DE GUERRA
O CÍRCULO BRANCO REPRESENTA O EXÉRCITO BRANCO NO CONTEXTO POLÍTICO DA REVOLUÇÃO RUSSA, COMPOSTA POR MONARQUISTAS, CONSERVADORES E LIBERAIS QUE SE OPUNHAM ÀS FORÇAS BOLCHEVIQUES. NA TRADIÇÃO SUPREMATISTA, O CÍRCULO É O SÍMBOLO DO PERMANENTE, DO QUE NÃO MUDA

O pôster ‘Vence os brancos com a cunha vermelha’, a forma triangular da cunha representa os bolcheviques, que atacam e vencem seus adversários, os ‘brancos’ (conservadores, religiosos e socialistas antibolcheviques) que disputavam o poder na guerra civil que aconteceu na Rússia entre 1917 e 1922. Alguns elementos gráficos menores flutuam pelo desenho, conferindo uma impressão de movimento.
‘Como um todo, além de ser um trabalho de propaganda política, o pôster apresenta uma função estética assumida. Seus grafismos simples transmitem um excesso de significado. O efeito estético provocado pelas formas geométricas puras realça o efeito ideológico da declaração escrita, e vice-versa. A imagem e a narrativa existem em dois espaços distintos. Elas meramente se interseccionam, produzindo em nossa percepção não um efeito unificado, mas uma impressão dupla ou paralela – um efeito binário’, escreveu o filósofo esloveno Aleš Erjavec, em ‘Postmodernism and the Postsocialist Condition’ (pós-modernismo e a condição pós-socialista, em tradução livre).
“O artista constrói um novo símbolo com seu pincel. Este símbolo não é uma forma reconhecível de qualquer coisa que já esteja acabada, já feita, já existente no mundo – é o símbolo de um novo mundo, sobre o qual estamos construindo e que existe por meio das pessoas.” – El Lissitzy
Em 1921, Lissitzky tornou-se embaixador cultural da Rússia na Alemanha. Pelos anos seguintes, realizaria exposições e colaborações com artistas alemães, incluindo personagens ligados aos movimentos Bauhaus e De Stijl. Dois anos depois, ele realizou com Maiakóvski um radical experimento de texto com arte tipográfica no livro chamado “Dlya golosa” (para a voz, em tradução livre).

Texto: Camilo Rocha, Guilherme Falcão, Thiago Quadros e Ariel Tonglet  |  =Nexo Jornal
Imagens: Kazimir Malevich –  Quadrado Negro’ e ‘Círculo Negro’1915; ‘Cruz Negra’ e ‘Branco no Branco’, 1920


(JA, Nov17)

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