quarta-feira, 18 de agosto de 2021

John Graz

Artista e designer suíço, introdutor da art déco no Brasil, ganha exposições na onda de revisão de personagens da Semana de 1922 



John Gras em seu Atelier, Genebra, Suíça, 1918


Ele pintou a fauna e a flora brasileiras, fez telas sobre comunidades indígenas, viajou até o Rio Grande do Sul para retratar os gaúchos, e a estados do Nordeste para representar a tradição do Bumba meu boi. Também se dedicou a desenhar móveis para as casas da elite paulistana, incluindo pormenores como fechaduras de portas e a disposição das plantas no ambiente.

Transitando entre as artes visuais e a arquitetura de interiores, o suíço John Graz —considerado um dos introdutores do estilo art déco no país— foi importante figura do meio intelectual paulistano no século 20, tendo publicado na revista Klaxon, e participado da Semana de Arte Moderna de 1922, com sete telas que pintou em Genebra, antes de se mudar para o Brasil.

Mesmo assim, seu nome é menos lembrado em comparação a outros artistas daquele período. Isto agora está mudando, graças à uma revisão dos participantes da Semana de 1922 -por conta do centenário do evento, em fevereiro do ano que vem-, atrelada à uma série de exposições.


Fogueira, década de 1930

Uma grande mostra aberta há pouco na Pina Estação, em São Paulo, e outras exposições na cidade, neste e no próximo ano, procuram dar conta da totalidade do trabalho de Graz, trazendo a público uma grande investigação de sua obra e diversas peças nunca vistas em público.

Graz ‘vem de uma formação nas artes decorativas, não existe separação entre artes visuais e arquitetura, mobiliário, mas uma tentativa de integração dessas várias manifestações artísticas’, diz Fernanda Pitta, curadora de ‘John Graz: Idílio Tropical e Moderno’, na Pina Estação, ao lado de Thierry Freitas.

Em 155 obras, sendo 42 recebidas de uma doação do Instituto John Graz, a mostra cobre cinco décadas da produção do artista, evidenciando seu fascínio com os tipos humanos, e as tradições do Brasil. Há um conjunto expressivo de guaches e aquarelas sobre índios, por exemplo, tema que perpassou a maior parte da vida produtiva do artista. 


Índios, Regina Gomide Graz, década de 30


As representações de pessoas com arco e flecha em meio à natureza ou descansando em redes sob a sombra de palmeiras apontam para uma aproximação idílica e um tanto genérica dos povos originários, afirma a curadora, no que ela considera um limite do trabalho de Graz.

Ao que se sabe, ele nunca estudou a fundo as tribos pelas quais tanto se interessava, diz Pitta, diferentemente de sua mulher, Regina Graz, que pesquisou as tecelagens de comunidades do alto Amazonas em busca de padrões para reproduzir em suas tapeçarias —alguns destes tapetes podem ser vistos no site do Museu de Arte Moderna, o MAM, na versão virtual da exposição ‘Desafios da Modernidade – Família Gomide-Graz nas Décadas de 1920 e 1930’. 


Gesso sem título, década de 1920


Embora o forte da mostra na Pina Estação sejam as pinturas, há também gessos, estudos de murais desenhados para interiores de residências e fotografias de ambientes projetados pelo artista, a exemplo do quarto do casal Antonieta e Caio Prado, uma família da elite cafeicultora paulista.

Pitta lembra que Graz trabalhava sob encomenda, transitando entre estilos distintos. Atuando como designer, realizou mobiliário de inspiração art nouveau, com formas arredondadas, os preferidos das elites antes de o modernismo e suas linhas geométricas entrarem em voga, e serem igualmente abraçados por ele, que então passou a decorar casas do arquiteto ucraniano Gregori Warchavchik, nome central do movimento moderno brasileiro.


Cadeira projetada pelo artista década de 1960 reeditada 2010


Na Pina Estação, há uma série de fotos em preto e branco de ambientes desenhados por Graz, além de uma cadeira de três pés em madeira nobre e uma poltrona. O forte do seu mobiliário, contudo, está na mostra do MAM, que reuniu seus famosos sofás e poltronas tubulares e algumas luminárias.

Uma das instituições por trás desta grande revisão é o Instituto John Graz, criado em 2005, em São Paulo, pela última mulher do artista, Annie. Ela preservou e catalogou o acervo e os documentos de Graz depois de sua morte, em 1980, até que, mais tarde, a neta, Claudia Taddei, assumiu a frente do instituto e iniciou o contato com instituições e colecionadores.

‘Nosso desejo é que as pessoas possam voltar a ter uma compreensão da obra do John como um todo’, afirma Taddei. Seu avô desenhava ambientes completos, amarrados num conceito único que incluía as pinturas ou murais e o mobiliário.


Despedida, 1930, de Antônio Gomide


O panorama do artista se completa com mais duas mostras. A primeira, no Museu de Arte Contemporânea da USP, o MAC, vai exibir dois estudos de murais que misturam paisagem tropical e elementos urbanos. As peças são parte de uma mostra que celebra a doação, para o museu, da coleção de mobiliário art déco dos colecionadores Fulvia e Adolpho Leirner, que reúne um conjunto de peças da época modernista tão caras à elite paulistana, como cadeiras de Flávio de Carvalho e o mobiliário da Casa Modernista de Warchawchik.

Ana Magalhães, diretora e curadora do MAC, afirma que as artes aplicadas —design, mobiliário e objetos pensados para a vida cotidiana— ‘nunca foram consideradas como uma produção da mesma relevância que as artes com A maiúsculo’.

Mas acrescenta que, nas últimas duas décadas, este movimento vem passando por uma revisão, sobretudo das peças produzidas na primeira metade do século 20, na qual John Graz e sua mulher, Regina, se incluem. Magalhães dá como exemplos a mostra dos 100 anos da Bauhaus, no Sesc Pompeia, em 2018, e o livro ‘Coleção Fulvia e Adolpho Leirner’, dos pesquisadores Ana Paula Cavalcanti Simioni e Luciano Migliaccio.

Por fim, está programada para o ano que vem uma exposição no Museu da Casa Brasileira focada no trabalho de Graz como designer e arquiteto de interiores, com peças nunca mostradas em público. Para Taddei, do instituto, ‘mais do que conhecido, Graz era respeitado pela sua inovação e pelo vanguardismo’.

 

JOHN GRAZ: IDÍLIO TROPICAL E MODERNO

PROJETOS PARA UM COTIDIANO MODERNO NO BRASIL

  • Quando - De 21 de agosto a agosto de 2022
  • Onde - MAC-USP - Av. Pedro Álvares Cabral, 1301, Vila Mariana, São Paulo; ter. a qui, das 11h às 19h; sex. a dom., das 11h às 21h
  • Preço - Grátis

 

 

 

Fonte: João Perassolo | FSP

 

(JA, Ago21)

 


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